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Depoimento de um adicto em recuperação

Postado em 20/10/2022

Autor: ALP (residente do CTDQ-PCJ -2011).







Sou
ALP, adicto em recuperação, tenho 32 anos e venho de uma família
conservadora onde a base da minha educação foi boa,

simples e
honesta. Vivi com amigos de classe média, sempre fui um jovem
popular, e sempre me arriscando, de forma que meus

pais sempre
me repreendiam, ficando em mim uma grande sensação de prazer em
fazer coisas erradas. Por isso comecei a

mentir para meus pais.
Na rua eu queria ser o melhor, o mais doidão, ter sempre vantagens,
foi então que eu iniciei no álcool e

nas drogas. Tinha prazer
em ser o que mais bebia entre os amigos. E eu sempre escondia dos
meus pais os meus

comportamentos insanos, pois eles não
aceitavam. Isto aconteceu antes de conhecer as drogas mais
pesadas.

Minhas irmãs davam um bom exemplo dentro de casa e eu
também queria dar bom exemplo, mas não conseguia, então

mentia
para poder ser aceito por todos. Então conheci a cocaína, achei que
poderia usá-la com controle, mas meu consumo

aumentou cada vez
mais. Eu estudava e trabalhava usando cocaína nesses locais. Passei
a ficar o maior tempo do meu dia

nos morros usando drogas, o que
me foi prejudicando e fazendo eu perder meus estudos e
trabalho.

Comecei a ficar muito compulsivo nas drogas de forma
que comecei a roubar as coisas de dentro de minha casa. E quando

meus
pais tentavam me ajudar me levando para algum lugar para receber
ajuda, eu tentava barganhar pedindo algo em troca,

e não levava
a sério os locais e pessoas que tentaram me ajudar .


Através de festas e dos amigos do surf comecei então a
aplicar cocaína injetável, o que durou por muitos anos. Continuei
tendo

varias internações, mas nada adiantou. Quando estava nas
festas eu não me sentia mais feliz e não sabia mais como
me

comportar.

Meus pais já não me ajudavam, pois não
acreditavam mais em mim e nem queriam mais tentar me ajudar.
Sentia-me cada vez

mais sozinho e sem limites. Então fui
trabalhar como vendedor numa loja de modas em que me vislumbrei com
um mundo

glamoroso, tinha um bom salário, pois me destacava nas
vendas.

Fui vivendo uma vida que não era a minha, e sempre
tirando proveito das pessoas, me prevalecendo do status de ser
um

vendedor eficiente. Comecei a participar de festas raves em
que experimentei muito o ecstasy. Comecei a faltar meu trabalho e

por
isso perdi vários empregos.

Como não consegui me manter nos
empregos, então comecei a traficar e a roubar mais, e com o dinheiro
fácil me drogava ainda

mais. Por curiosidade comecei a usar
crack. Com o dinheiro que ganhava pagava dívida de drogas e emagreci
muito.

Conheci uma mulher que hoje é mãe de minha filha,
moramos juntos por quatro anos, achava que poderia controlar o uso
de

drogas estando casado, mas não conseguia e usava cada vez
mais. Fui para o fundo do poço com o crack. Eu vendi a
minha

geladeira, microondas, máquina de lavar, computador,
berço do bebê, para comprar e usar o crack. Só restou a televisão
e a

cama. Então nos separamos.

A minha doença progrediu,
pois me aprofundei no mundo do crime e de prostitutas. Queria uma
resposta, uma explicação,

uma solução para minha doença,
mas na verdade era apenas uma forma de aliviar a dor da minha
adicção. O problema já não

era somente as drogas, mas sim
eu.

E hoje me encontro a seis meses no CTDQ-PCJ
conhecendo melhor minha doença da dependência química e
investindo na

minha pessoa que antes foi destruída pela doença.
Descubro e me aproprio, a cada dia de minha recuperação,
ferramentas de

vida que me fazem ter força para continuar
lutando contra esta doença. O que me cabe é estar atento e
perseverar neste

caminho.





CARTA DE DESPEDIDA AO AMOR MALIGNO

Autor: ALP (residente do CTDQ-PCJ)

Neste momento difícil, com o coração partido, expresso meus sinceros
sentimentos, a você que sempre amei e adorei. Estive fiel nesta longa
jornada dos últimos 14 anos de minha vida, não posso negar que você foi
minha companheira, tive prazer com você, que sempre me pareceu
consolar em muitos momentos. Foi via de mão dupla, dei tudo de mim, fui
capaz de priorizar mais você do que os momentos com minha família e
meu trabalho. Deixava qualquer responsabilidade para estar contigo. Os
anos foram se passando e percebi que você me tomou tudo, me dominou
de tal forma que minha vida passou a ser controlada por você. Hoje me
encontro em uma Instituição, sozinho sem você.
Hoje estou aprendendo a viver sem você, mesmo às vezes não querendo
aprender. Jamais vou te esquecer, pelo que você me deixou: essa doença
incurável, progressiva e fatal, que sempre ouvia falar em grupos de mútua
ajuda. Mas hoje sozinho aqui sem você, nesta Instituição (CTDQ-PCJ),
começo enxergar o tamanho dessa doença que diariamente tenho que
lidar, e que nesses 32 anos de minha vida, morri, mas agora começo a
viver, conhecendo melhor a mim e a você. E descubro que você havia

ocultado todos os meus sentimentos me trancando em um baú com um
cadeado chamado crack.
Digo-lhe adeus. Hoje estando com algumas vinte e quatro horas limpo
sem você, vivencio a dor, o sofrimento da recuperação de lidar com algo
que desconheço: amor, ódio, raiva e saudades.
Hoje te respeito, mas acabou. Não quero mais você. Só por hoje estou
aprendendo a viver sem você, mesmo às vezes não querendo aprender.
Com você perdi todas as esperanças, e sem você aprendo a ter esperanças
e muito mais, experimento a dor e a delicia de ser verdadeiramente o que
sou no meu real tamanho.

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